Natação para bebês e crianças, quando iniciar? – parte 6

O momento correto deve levar em conta as expectativas dos pais, opinião do pediatra da criança e principalmente o bem-estar da criança

Acho que hoje eu consigo. Só complementando então, como conversamos na parte 5 dessa série, uma questão médica a mais, para fecharmos a matéria.

E antes de continuar, mais uma vez, gostaria de deixar claro que não estou tratando aqui de técnicas adequadas, de metodologia, e sim de questões médicas que deveriam ser levadas em consideração nessa e em qualquer outra decisão que possa envolver riscos e benefícios para crianças.

Essas são (ou pelo menos, em minha opinião, deveriam ser) as principais missões de um profissional de saúde: INFORMAR e PREVENIR.

Lordose e natação

Um estudo recente, publicado no The Journal of Pediatrics, comparou a prevalência de deformidades de coluna e dor lombar em adolescentes que competiam em natação (112 adolescentes / 62 deles sexo feminino) e um grupo controle (217 estudantes / 106 meninas), com a mesma média de idade (12,5 anos).

Os resultados apontaram que a prática competitiva de natação aumentavam o risco de assimetrias de tronco e de hipercifose e hiperlordose de forma significativa e duplicavam as queixas de dores lombares em meninas.

Atenção: os dados desse único estudo contradizem os benefícios da prática de natação no tratamento de escoliose e mostram um aumento de dores lombares em meninas, embora considerem a natação um esporte completo.

Criança submersa na água da piscina - Foto: Sergey Novikov/ShutterStock.com

Muitos benefícios da prática da natação desde cedo

Como eu apontei durante essa série, recebi muitas informações e muitos contatos de gente muito séria vinculada à área de natação infantil. Um desses contatos foi motivo da parte 3 dessa série.

Outro desses contatos muito proveitosos foi com o Instituto Nacional de Natação Infantil (INATI) através de um de seus idealizadores, Sr.Rafaele Mardomo. Entre vários links indicados para meu conhecimento, gostaria de ressaltar dois.

Um estudo de casos-controle publicado no Journal of American Medicine Association – Pediatrics (JAMA), em 2009, estimou a associação entre aulas de natação e os riscos de afogamento entre 1 e 19 anos.

O estudo comparou um grupo de 88 famílias em que houve relato de crianças que se afogaram involuntariamente com um grupo controle pareado de 213 famílias onde esse evento não havia acontecido.

Após exclusão de casos em que o afogamento foi de intenção desconhecida ou em que ocorreram em situações em que a habilidade de nadar não traria impacto nenhum em riscos, concluiu-se que a participação em aulas formais de natação foi associada em uma redução de 88% de risco de afogamento no grupo de 1 a 4 anos (mesmo com ressalvas dos autores em relação à precisão das estimativas).

O outro foi o relatório final (já traduzido para o português) de um estudo que, segundo as palavras do próprio Sr. Rafaele Mardomo, é “O maior e mais importante feito pela Griffith University da Austrália, finalizado em 2013, comandado pela Dra. Robyn Jorgensen da Faculdade de Educação, que analisou quase 7 mil crianças, por cerca de 4 anos e concluiu que crianças que começaram a natação na primeira infância chegaram na idade pré-escolar com ganhos significativos, quando comparadas com crianças que não tiveram essa oportunidade. Essas diferenças não se relacionam apenas ao desenvolvimento físico – como seria esperado – mas também tem importante relação com áreas da linguagem e cognição.

Gostei muito da seriedade desse relatório e de suas informações sobre desenvolvimento das crianças na primeira infância. São muito interessantes. As ressalvas colocadas no próprio estudo valem uma reflexão e mais incentivo a estudos (página 61):

Não podemos dizer conclusivamente que a natação seja responsável pelas diferenças que identificamos neste estudo. Simplesmente podemos dizer que crianças que fazem aulas de natação atingem uma larga variedade de marcos (pesquisa) e habilidade, conhecimento e disposições (testes para crianças) mais cedo que a população normal.

Não podemos dizer conclusivamente que mais aulas ou mais tempo por semana teriam tido uma diferença significativa ainda maior – o número de crianças neste estudo que fizeram mais de uma aula por semana era muito pequeno para tirar qualquer conclusão concreta.

E nas recomendações finais (página 62), vale a pena ressaltar:

Todas as crianças deveriam ser estimuladas a fazer aulas de natação para segurança e bem estar geral.

Recomendações para determinar o que constitui programas de natação de qualidade deveriam ser desenvolvidas para ajudar os pais na escolha da escola de natação que pode melhorar habilidades, conhecimentos e disposições para ajudar a transição para a escola.

Minha opinião

Pra não ficar em cima do muro, ou do trampolim, ou na borda da piscina, vou mergulhar de cabeça e falar minha opinião (horrível né? Rsrsrs. Mas é o que tem pra hoje).

Não há como negar a importância da prática da natação na infância, quer seja por ser uma atividade física interessante e completa, quer seja pela influência favorável em questões de crescimento e desenvolvimento das crianças.

Do ponto de vista médico, o que eu recomendo aos meus pacientes, em consulta, conhecendo suas capacidades e limitações físicas, emocionais, suas necessidades e o vínculo familiar:

  • Como regra geral, pelas questões de desenvolvimento neurofisiológico, avaliação de benefícios e riscos à saúde, eu prefiro indicar a prática de natação acima de um ano de idade, sempre com os pais ou algum cuidador junto, toda vez que a criança se aproximar de uma piscina, ou rio, ou mar, até os 4 anos de idade;
  • Cada caso é um caso e precisa ser avaliado individualmente. Pode haver situações em que mesmo depois de um ano de idade, essa prática não seja recomendável e seja preferível aguardar um pouco mais para iniciar o contato com a piscina;
  • É importante entender qual a intenção de se colocar uma criança em uma aula de natação. Socialização, atividade física, melhora do sono, por exemplo, podem ser conseguidas, de uma forma semelhante, em “atividades físicas” ou brincadeiras informais (brincar no parque, andar de bicicleta, jogar bola, correr, pular, etc.), nas quais o vínculo e a proximidade dos pais fazem toda a diferença (independente se dentro ou fora da piscina).
  • Para a prática da natação, os pais devem buscar escolas sérias, com professores gabaritados, formados e informados, que possam justificar seus métodos, sem promessas de formar campeões olímpicos desde os 2 ou 3 anos de idade (embora isso possa até acontecer naturalmente).

Para concluir essa matéria, embora o tema esteja aberto e a cada dia apareçam novas evidências a favor e contra, nada substitui o vínculo familiar, e todo o esforço deve ser feito para que a escola de natação, ou qualquer outra atividade programada, não se transforme em um depósito de crianças, com a terceirização de seus cuidados, uma das grandes preocupações da Pediatria Moderna. Criança feliz e segura é a que tem apoio e vínculo familiar.

Esse artigo faz parte de uma série, para ver as demais partes, acesse:

Dr. Moises Chencinski

Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo com título de especialista em pediatria pela Associação Médica Brasileira (AM...

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